Páginas

Marcadores

quinta-feira, 24 de maio de 2012

NA HORA DA SESTEADA


                         Foto de Giancarlo M. de Moraes


Numa prancha de timbaúva, que ficava sob a sombra de um cinamomo entre o galpão e a casa, era onde o peão sesteava todos os dias. Estirava-se de barriga para cima, cobria o rosto com o chapéu, cruzava as mãos sobre o peito e com as canelas fazia uma tesoura

Ali, jiboiava por quinze a vinte minutos, com o cusco também estirado embaixo da cama improvisada. Às vezes dava tempo para os dois sonharem.

Certo dia se espichou mais uma vez, porém não conseguiu dar nenhuma pescadinha. Tinha algo lhe azucrinando a cabeça. Numa das volteadas de namoro, foi além do permitido e a cegonha aproveitou a oportunidade, só que em dose dupla.

Andava preocupado, pois o casamento era coisa certa. Teria que montar um rancho, sustentar a família. Quatro bocas para quem estava acostumado alimentar uma só e a pegada às vezes escasseava por ali.

Deitado naquela prancha e com o chapéu sobre o rosto, por baixo da aba viu uma pequenina aranha, que pacienciosamente confeccionava uma teia que ia da volta de um galho do cinamomo até a ponta do santa-fé do galpão.

Ela construía sua armadilha que cobria um território grande, em relação ao seu tamanho, apesar de ter a falta de duas perninhas. Não deu para ele ver a conclusão, pois o tempo havia passado rápido e levantou-se num upa pra continuar a lida.

O dia passou, veio a noite mal dormida. 

Amanheceu, não chimarreou, iniciou a lida e sem apetite nem foi pra mesa. Na hora da sesteada, como de costume, foi se espichar sobre a prancha. O cusco já ressonava. Deitou-se e ao levar o chapéu para cobrir o rosto, lembrou-se da aranha. Lá estava ela bem no centro da teia, onde alguns insetos já tinham se malhado e até comidos por ela.

A armadilha continuava em perfeitas condições e a proprietária só no aguardo de novas provisões.

O peão, lembrando do tamanho da aranha, do trabalho paciencioso dela e da sua deficiência física, vendo a fartura na sua despensa, refletiu sobre o que vinha lhe atormentando o pensamento e reagiu consigo mesmo.

Que diacho de homem eu sou?

Nenhum comentário:

Postar um comentário